Sim, eles já estão no segundo. E não tenham dúvidas: virão o terceiro, o quarto... e tantos quantos forem necessários, enquanto esses cruzeiros forem lucrativos.
Os religiosos não gostam quando uso o termo "mercado da fé", por considerá-lo ofensivo e depreciativo. Sinto muito, mas não há como não reconhecer que existe mesmo um mercado da fé: são contribuições, campanhas, bandas, discos, livros, editoras, programas de rádio e TV, anúncios, cursos, escolas, venda de santinhos e "souvenir", universidades, gravadoras gospel, shows de cantores gospel e agora até (pasmem!) turismo e cruzeiro marítimo religiosos (este último, o mais novo filão descoberto).
Embora a motivação seja um "cruzeiro católico", cristãos de todas as denominações são bem-vindos porque esses cruzeiros só são rentáveis se tiverem uma ocupação de mais de 70%. Assim, quanto mais turistas, maior o lucro. Mas a experiência já deu certo no ano passado quando houve a lotação máxima e tem tudo para dar certo neste ano também, a despeito da ausência do padre cantor Fábio de Mello, principal atração do cruzeiro anterior (seu cachê é muito alto, tanto ou mais do que o de Roberto Carlos, mais do que o do Fábio Júnior e mais do que o de Agnaldo Rayol).
O cruzeiro é de apenas 4 dias, no litoral Rio-Santos, a ser realizado no período 1 a 04/02/2011, com pagamentos parcelados em 10 vezes, "sem juros", segundo a CNBB, Regional Sul e a agência "CNS - Viagens Religiosas" (sim, já existem agências de viagens especializadas).
O 1º Cruzeiro Católico "Navegando com Nossa Senhora"
No ano anterior, a principal atração foi o padre cantor Fábio de Mello, que serviu de chamariz para os fiéis, ávidos por "congregar-se em paz e em comunhão com Deus", num ambiente ao mesmo tempo divertido, luxuoso e "abençoado".
Para reforçar, foram levados também 62 padres e 3 bispos, que celebraram 2 missas diárias, confissões e rezas de terço, tudo em alto mar e para atender a todos os gostos. O custo médio por pessoa foi estimado entre 1,8 a 2,4 mil reais, dependendo das mordomias e acomodações escolhidas. E o que é melhor: tudo parceladinho em 10 vezes, sem juros, no cheque ou cartão (é mole?). Em vista de tantas facilidades e do apelo religioso, o cruzeiro partiu com a lotação (1900 pessoas) esgotada.
Conquanto não sejam revelados os números oficiais de todas as entradas financeiras do evento, foi fácil fazer as contas: com base somente no preço e no número de pessoas que participaram (sem considerar as taxas, as vendas de souvenirs, despesas extras, etc) a arrecadação bruta para um evento de 4 dias
foi de, aproxidamente, 4 milhões de reais, um alto negócio.
Ora, se isso não é um tremendo marketing religioso para um mercado composto de um público pré-selecionado e com altas motivações para adquiir o pacote turístico, o que mais seria? Como denominar um esforço empreendedor dessa envergadura?
Tem milagre acontecendo agora nesse mar
Este era o estribilho da canção-tema entoada no primeiro cruzeiro e repetida exaustivamente, antes durante e depois do evento, inclusive em vídeos promocionais. E para os organizadores, deve ter acontecido milagre mesmo porque o lucro e a receptividade superaram as expectativas, já encorajando um segundo evento, mesmo antes de encerrar-se o primeiro. Vejam no vídeo ao lado, que promove o segundo cruzeiro, alguns flagrantes do cruzeiro anterior, onde a canção "Viajando com Nossa Senhora" serve como pano de fundo. E dentre as atrações presentes estarão a banda Rosa de Saron, Myriam Rios, Adriana e outros cantores gospel.
Vejam a declaração do Pe Fábio de Mello, ao término do primeiro cruzeiro (está no vídeo de depoimentos referentes àquele cruzeiro):
"É fantástico a gente saber que a Igreja 'avança' para essa oportunidade nova." (grifo nosso)
A estratégia de marketing dos católicos destas vez deu um banho na dos evangélicos. Mas não se assustem porque logo, logo haverá também um "cruzeiro marítimo evangélico" que, certamente, fará mais barulho que o dos católicos nesse "segmento do mercado".
Um mercado de mais de 1 bilhão de reais mensais
Segundo dados que se informam exaustivamente (sem comprovação oficial), o mercado da fé, no Brasil, movimenta mais de um bilhão de reais/mês com a venda de produtos religiosos, aí se incluindo, principalmente, o lucro proveniente da venda de CDS e livros gospel. Para se ter uma ideia, basta citar que dentre os 20 CDs musicais mais vendidos no país, os do Pe. Marcelo Rossi ocupam o primeiro lugar e os do Pe. Fábio de Mello o segundo. As gravadoras gospel estão em festa.
Então, porque se ofenderem os religiosos quando nos referimos à existência de um lucrativo e disputado mercado da fé, sobre o qual a Igreja avança com unhas e dentes? Só porque não sou o Pe Fábio de Mello?
Nota: Este texto também foi publicado pelo autor na Rede Irreligiosos
2 comentários:
Graças a Deus e ao tal mercado da fé que vocês se referem, pude realizar um sonho de muitos anos. Participei do 2º Cruzeiro Católico Navegando com Nossa Senhora.
Maravilhoso ! Naõ tenho palavras para expressar tamanha alegria que estou sentindo.Muitas pessoas de classe média e baixa estão podendo realizar sonhos assim como eu.
Que bom, Carmem! O que você disse "Muitas pessoas de classe média e baixa estão podendo realizar sonhos assim como eu" é hoje, de fato, uma verdade. Até meu filho que ganha apenas cerca de R$ 3.500,00/mês, já fez um cruzeiro desses (não o católico, o normal) pela costa brasileira, pagando em "suaves prestações mensais".
Mas as emoções que você sentiu, não creio que seja pelo fato de o cruzeiro ser católico. Se fosse um cruzeiro normal ficaria emocionada do mesmo jeito, principalmente se fosse a sua primeira experiência em alto mar, abordo de um navio de luxo.
O fato de se fazer um "cruzeiro católico" me parece um oportunismo econômico no mercado da fé.
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